Duas tradicionais empresas do Rio Grande do Sul (RS) surpreenderam o mercado ao decretarem falência após acumularem um volume milionário de dívidas. A revelação, feita pelos escritórios de advocacia que conduzem os processos, expôs um cenário que ninguém imaginava nos bastidores do setor.
A fabricante de calçados Mulher Sofisticada, localizada em Três Coroas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, encerrou suas atividades e deve protocolar um pedido de autofalência ainda nesta semana. A decisão ocorre após o acúmulo de dívidas que ultrapassam R$ 18,3 milhões, segundo o escritório de advocacia responsável pelo processo.
Duas tradicionais empresas do RS decretam falência após dívidas milionárias: A fábrica empregava 77 trabalhadores
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O presidente do Sindicato dos Sapateiros de Três Coroas, Erni Rinker, afirma que a situação financeira da empresa já apresentava sinais de deterioração há meses. A fábrica empregava 77 trabalhadores, todos prestes a ser desligados após o fechamento.
O escritório MSC Advogados, que representa a companhia, informou que houve tentativas de renegociar os débitos, mas nenhuma proposta foi adiante. Apesar do encerramento das operações, o sindicato destaca que outras empresas do setor demonstraram interesse em contratar os trabalhadores demitidos, o que pode amenizar os impactos sociais do fechamento.
Fundada em 2012, a calçadista Mulher Sofisticada enfrentou sucessivas dificuldades nos últimos anos. A empresa chegou a produzir 3,7 mil pares de calçados femininos por dia para grandes marcas do mercado nacional. Nos dias que antecederam o encerramento, porém, a produção havia caído para cerca de 1,5 mil pares diários, refletindo a crise financeira que culminou na decisão de pedir autofalência.
Qual a segunda empresa do estado?
A Vier Indústria e Comércio do Mate Ltda., fundada em 1944 e sediada no município, teve sua autofalência decretada pela Justiça. A decisão judicial determinou o início do processo falimentar, nomeou um administrador judicial e suspendeu todas as execuções em andamento contra a empresa.
A própria Vier entrou com o pedido de autofalência, amparada na legislação que permite que empresas em situação financeira irreversível reconheçam oficialmente a impossibilidade de continuar operando. O objetivo é encerrar as atividades de forma organizada e iniciar o pagamento dos credores sob supervisão do Judiciário.
Segundo o relato da empresa, as operações foram encerradas em setembro de 2024. Entre os fatores que agravaram a crise estão a falta de matéria-prima, impulsionada pela substituição dos ervais por monoculturas de soja, problemas de saúde do sócio-administrador que faleceu em 2020, aumento no custo dos insumos e do transporte, endividamento crescente e um incêndio registrado na sede em 2012.
Ao avaliar o pedido, o juiz responsável destacou que, apesar de insolvente, a empresa ainda possui fontes de receita. As marcas registradas da Vier estão licenciadas à Ervateira Rei Verde Ltda, que realiza pagamentos mensais. Além disso, parte da estrutura e dos equipamentos da filial no Paraná foi arrendada para a Maracanã Indústria e Comércio de Erva-Mate Ltda.
Com esses elementos, o magistrado concluiu que a massa falida tem condições financeiras de arcar com as despesas do processo e, por isso, negou o pedido de gratuidade judiciária.
Decisão judicial
Com base nos documentos e nos demonstrativos apresentados, o juiz reconheceu oficialmente o estado de insolvência da empresa. Ele também determinou a suspensão do leilão de um imóvel da Vier, que ocorreria em um processo de execução fiscal, garantindo assim o tratamento igualitário entre todos os credores.
Reviravolta
Apesar da falência da empresa, a marca continuará presente no mercado. Isso se deve a um acordo pouco divulgado, firmado em 2024, que garante a continuidade do produto nas prateleiras.
A empresa Rei Verde, de Erechim, firmou um contrato de arrendamento da marca Vier pelo prazo de 30 anos. O acordo envolve exclusivamente o uso do nome, não a estrutura fabril que encerrou atividades em Santa Rosa. Com isso, cabe agora à Rei Verde toda a produção, o envase e a distribuição da erva-mate, preservando a presença da marca — especialmente na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde ela tem maior reconhecimento.
De acordo com o administrador judicial da massa falida, André Estevez, o contrato determina que 3% da receita obtida com as vendas da erva-mate Vier sejam repassados mensalmente à massa falida. Esses valores, somados aos recursos arrecadados com a venda dos bens da antiga fábrica, serão utilizados para quitar dívidas com os credores.
O cenário do setor também contribui para o contexto da crise: embora haja atualmente excesso de oferta de erva-mate, a antiga fabricante apontava justamente a falta de matéria-prima como um dos fatores que comprometeram sua saúde financeira.

