Em uma votação marcada por forte polarização, a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (5) um Projeto de Decreto Legislativo que suspende os efeitos da resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), publicada em dezembro de 2024. A norma estabelecia diretrizes para garantir o acesso de crianças e adolescentes ao aborto legal nos casos previstos pela legislação brasileira: risco de vida para a gestante, anencefalia fetal e gravidez resultante de estupro.
Com 317 votos favoráveis e 111 contrários, o projeto foi relatado pelo deputado Luiz Gastão (PSD-CE), coordenador da Frente Parlamentar Católica, e teve sua tramitação acelerada por meio de regime de urgência aprovado minutos antes da votação. A base governista se posicionou contra a proposta.
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O que dizia a resolução do Conanda
A resolução do Conanda buscava assegurar que crianças e adolescentes vítimas de violência sexual tivessem acesso à informação clara e segura sobre seus direitos, incluindo a possibilidade de interromper a gestação. O texto previa:
- Autonomia da vítima para decidir sobre o aborto legal, mesmo sem o consentimento dos pais, quando houvesse risco de dano físico, mental ou social.
- Acompanhamento por profissionais do Sistema de Garantia de Direitos durante todo o processo.
- Descentralização dos serviços de aborto legal para ampliar o acesso em regiões remotas.
- Proibição de constrangimentos, ameaças ou indução de culpa à vítima.
Segundo o Ministério das Mulheres, a medida respondia a um cenário alarmante: entre 2013 e 2023, mais de 232 mil meninas com até 14 anos deram à luz no Brasil — todas em idade inferior à do consentimento legal, o que caracteriza estupro de vulnerável. Em 2023, apenas 154 meninas conseguiram acessar o aborto legal.
Argumentos dos parlamentares favoráveis ao projeto
Deputados da oposição alegaram que a resolução do Conanda concedia “autonomia decisória completa” às crianças e adolescentes, dispensando a autorização dos pais. Para a deputada Chris Tonietto (PL-RJ), isso poderia levar a uma “submissão quase compulsória ao procedimento de aborto”, colocando em risco a vida da gestante.
Reação do governo
O governo federal, por meio dos ministérios das Mulheres, Justiça e Direitos Humanos, tentou barrar o avanço do projeto. Notas técnicas foram elaboradas para esclarecer que a resolução não criava novas hipóteses de aborto, mas apenas regulamentava o atendimento nos casos já previstos em lei. A mobilização contrastou com a posição da gestão Lula em dezembro de 2024, quando todos os representantes do governo no Conanda votaram contra a resolução.
Agora, com a aprovação do projeto, especialistas alertam para o enfraquecimento da atuação do Conanda e o risco de retrocesso na proteção de direitos fundamentais de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual.

