O que veio primeiro: o ovo ou a galinha? Na política, o ovo é o partido; a galinha, o eleitor. Dá para entender que eleitos são mais fiéis às galinhas do quintal que frequentam do que aos ovos genéricos que se amontoam em programas partidários e coligações de ocasião. Sem juízo de valor, vale mais o voto que elege à Câmara do que o apoio que põe um presidente sobre a República – seja na caipira Pirapora ou na avassaladora São Paulo.
Não é diferente para cá da ponte sobre o Gravataí. Canoas tem seus exemplos de fidelidade maior ao eleitorado do que à decisões tomadas pelos partidos. Os dois da vez são os vereadores Gilson Oliveira, do Avante, e Abmael Oliveira, do Solidariedade. Os partidos deles definiram apoio a Lula para presidência da República e Eduardo Leite para governador do Estado, mas eles vão de Jair Bolsonaro e Onyx Lorenzoni, do PL. Notórios anti-petistas, os dois foram vistos juntos no ato ‘BolsOnyx’ de sábado na Avenida Inconfidência, terminado às 12h59 porque 13h, enfim, mete um certo medo na turma do 22.
Gilson contou ao blog que entende o posicionamento do partido que decidiu apoio a Lula e, agora no segundo turno, a Eduardo Leite. Mas que ele, desde sempre, foi bolsonarista. Se o alguém mudou, não foi ele: foi o partido. “Em 2018 já votei no Bolsonaro”, conta. “Além disso, em 2020, quando Jairo Jorge me procurou para fazer parte do projeto que venceu as eleições, ele queria um representante da direita mais conservadora junto ele. Eu era esse representante. Sempre fui conservador, meu eleitorado sabe. Estranho seria eu estar com o PT agora”.
“O Avante não põe cabresto. No primeiro turno, não me manifestei e apoiei os candidatos do partido na cidade. Entendo que tenham tomado esse caminho, mas eu sigo fiel aos meus princípios”, completa Gilson. “Não temo represálias. Espero que não aconteçam”.
Princípios também são os motivos invocados por Abmael para justificar o voto bolsonarista mesmo estando formalmente ligado a um partido lulista, o Solidariedade do sindicalista Paulinho da Força. Formalmente ligado, digo eu, porque na prática Abmael é vereador de comportamento independente. Está ligado ao governo com a bênção do seu padrinho político, o prefeito em exercício Nedy de Vargas Marques, mas não sente que deva ‘amém’ à sigla que sustenta. E, por isso, se sente à vontade para escolher outro caminho na eleição. “Sou um liberal conservador e anti-petista”, se define. “Jamais estaria ao lado do Lula”. Se teme represálias, Abmael não parece preocupado. “Não fui procurado pelo partido. Minha visão de mundo é diferente, acho que não farão nada.”
Bolsonaristas, aliás, estão em casa na Câmara de Canoas. Dos 21 vereadores, 13 votam no capitão-presidente. Com Lula, são 4. Outros 4 não anunciaram o voto – e não contam para ninguém, nem sob tortura.